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domingo, 26 de dezembro de 2010

...é ter saúde

Na nova sede da Associação Peter Pan, anexo oncológico do 
hospital infantil Albert Sabin, só existe lugar para a alegria

Felipe tem na ponta da língua de que mais gosta no mundo: ''do meu pai''. 
E de brincar de carrão bem grandão (Igor de Melo)

Felipe, do que você mais gosta no mundo?”, pergunto. “Eu gosto do meu pai”, ele responde sem pensar. “E de brincadeira?”, continuo. “Gosto de brincar de carro. Um carrão bem altão, bem grandão”, sorri, com os lábios, os dentes, os olhos e a alma. Tomo coragem e digo: “Felipe, você gosta daqui?”. Ele, que tem dois anos de vida e um de tratamento na Associação Peter Pan, muda a expressão. “Aqui é o hospital ‘véi’, eu sou furado”, desabafa, com um band-aid redondinho do Homem-Aranha no bracinho magro. 
O tratamento marca, mas não abate. Mal deixei Felipe Cauã Feitosa com a avó, dona Maria Inês, ele começou a brincar. Quer aprender as letras do alfabeto, montar peças coloridas e falar (do jeito enrolado das crianças de dois anos, e) pelos cotovelos. Quem é ainda mais espevitado é o João Pedro Alves, o Pedrinho, de três anos. Há sete meses, ele, brincando, caiu e machucou a perna. Em um raio-x, foi descoberto um tumor no fêmur.


“Quando o João Pedro chegou aqui, não andava. Agora ele corre o tempo inteiro, acha bom demais!”, conta a mãe, enquanto ele, do outro lado da brinquedoteca, martela um pianinho de brinquedo. A previsão para a conclusão do tratamento dele é de um ano, no máximo um ano de meio. Ele já anda de bicicleta, responde bem à medicação e, até, lá, é só alegria. “Apesar de ser um tratamento sério, eu sempre estou alegre para cuidar dele. O João Pedro não sabe o que acontece com ele, porque eu não comento muito. Digo que ele precisa curar a perna. Agora a médica viu no fígado também. Mas, com a medicação, está diminuindo, tanto que ele nem foi para a cirurgia”, comemora. E conclui: “Felicidade é ter saúde e ter Deus no coração”.


Com prédio recém-inaugurado, a Peter Pan é um lugar lindo. Da recepção à brinquedoteca, tudo é absolutamente colorido e confortável. É lá também onde surgem grandes amizades, como a de Ana Joyce e Sabrina, de nove anos. “A gente se conheceu quando estava internada”, lembra Sabrina, no hospital há oito meses. Juntas, elas pintam as unhas, brincam e conversam sobre os meninos, mas nada de paquera ainda. “É que alguns são muito chatos!”, entrega Ana Joyce, com seis meses de tratamento.


Inteligentíssima, articulada e madura, Joyce conta que precisou parar de estudar. “É bom estar aqui, mas é chato também. Sinto muita falta da escola, mas já vou começar a estudar em casa, em 2012”. E a felicidade, o que é? “Para mim, são duas coisas: ficar boa logo e ganhar presentes. Aprendi no hospital a não ficar pensando muito na minha doença”, ensina.


Larissa Chaves Sousa, 7, é tímida e adora se enfeitar. Adora brincar de Barbie e sente falta de Iguatu, onde nasceu. Relógio, vestido, enfeite no cabelo, tudo é cor de rosa no look da menina. A felicidade para ela está nas brincadeiras: “Quebra-cabeça e pintar, adoro pintar. Agora estou praticando o ABC”, e diz as letras todas até o Q, “porque ainda não aprendi o resto”. Larissa também fica feliz quando ganha presentes. O mais desejado agora é um DVD portátil. “É para eu ficar vendo filme quando me internar. Era do Gelo 2 e 3 são os que eu mais gosto”.


A brinquedoteca da Associação Peter Pan tem ainda uma dupla de caras legais, o Lindomar Fonseca Jr. e o Richarlyson Hugo Rodrigues, 12. Juntos eles correm, jogam damas e driblam a solidão do tratamento. “O Richarlyson veio de férias para Fortaleza e não voltou mais, desde o dia 31 de julho”, lembra a mãe, Fátima Rodrigues Lima. Nascido em Itapipoca, o garoto tem ainda dois anos pela frente. A saudade de casa é grande. “Se eu pudesse, já estava lá”, ele diz. Na rotina do hospital, ele diz que o momento mais feliz é o do café da manhã. “Ele adora comer”, diz a mãe, “Mas é no café que ele recebe a medicação, e ele sabe que é pela saúde dele”.


Na correria entre diversão e cura, Richarlyson só sonha com o a vida no interior. Para ele, felicidade é pescar: “Pesco à noite para poder pegar peixe grande, cará, traíra. Uma vez pesquei um de três quilos e meio. Queriam que eu vendesse, mas eu levei para casa, e a minha avó fez pirão”. Precisa mais?

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Por Marcos Silva